As 64 sombras de Portugal
Sr. Presidente,
Tirei o curso de biologia, e não arranjei emprego. Não escrevi uma carta como a outra menina para arranjar curso, e talvez falha minha, pois poderia estar a contribuir para um Portugal melhor. Agora estou em casa, a remoer a noticia das 64 mortes que ficaram em Pedrogão Grande por causa da má gestão de ordenamento de território de nosso país, que não é novidade nenhuma há anos. É triste um país, que TODOS OS ANOS, vê o mesmo ciclo acontecer: chega o Verão, chegam os incêndios. Seja um ano seco, seja um ano com muita precipitação a história é mesma, são poucos os dias em que não houve um fogo activo, são poucos os que não têm mão criminosa, são poucos os bombeiros e são poucos os recursos.
Portugal tem tudo para ser um país grande, mas vivemos na sombra dos descobrimentos e vivemos na excelência da nostalgia do passado. Somos um dos países na Europa que mais exporta madeira, e um país que tem uma gestão e ordenamento de território nula. Vá, não vou ser má temos alguma gestão: os nossos técnicos florestais administram o território para plantar eucaliptos e pinhais, para madeira, para vender a Portuceis e afins. Quando temos técnicos que dizem, e estou citar porque eu estava lá " Em vez de ter um terreno vazio que sofrerá erosão é melhor plantar mimosas do que não ter nada" ao qual respondemos "mas nós temos arbutos autótones que fazem o mesmo trabalho" e a resposta é "sim mas trabalhar com a mimosa é mais fácil", é óbvio que a gestão e eficiência é nula.
É triste terem morrido 64 pessoas ( e isto é a contagem actual), porque uma culpa que é sempre dos mesmos.Isto não é falar de boca cheia, não é falar pela boca fora. A culpa é dos nossos governos, porque não existe esforço da vossa parte e compactuam com as empresas madeireiras (não nos vamos esquecer da lei da liberalização da plantação do eucalipto). Enquanto continuarem com promessas vazias no final de todos os Verões e não passarem para o terreno com pessoas com formação e ética, o nosso Portugal vai ser um degradé de cinzento, quando deviamos ter uma responsabilidade ainda maior pela biodiversidade do nosso país pois estamos num dos hotspots mundiais de biodiversidade. Vergonha alheia, é o que tenho. Vergonha alheia e vergonha minha, porque embora a culpa seja do Governo porque não administra o que é vosso, nem fiscaliza corretamente o resto, todos somos cúmplices neste crime. Somos cúmplices porque somos aqueles que não se esforça pelas gerações futuras exigindo aos superiores e aos iguais que cumpram o melhor para o futuro. Somos aqueles que não vão reciclar porque os caixotes não estão na minha rua ou estão na outra ponta da rua. Somos aqueles que vão a um evento e não podem aguentar a garrafa de água na mão mais uns minutos até encontrar um caixote de lixo. Somos aqueles que compactua com a venda de espécies exóticas nas lojas dos animais "porque são fofinhos". Somos aqueles que achamos bonito os transportes públicos mas queremos ambos ter o nosso carrinho. Somos aqueles que olhamos para os nórdicos e queremos ser iguais mas com esforço minimo. Enquanto não mudarmos as nossas atitudes perante o que nos rodeia, enquanto não nos esforçamos por aquilo QUE È NOSSO, não chegaremos a lado nenhum, e vamos ser sempre uns submissos.
Acabo esta carta, Sr. Presidente, a pedir que coloque a mão na consciência. Herdou um país quebrado pela crise e pelos anos de mau comportamento dos seus governantes e dos seus habitantes. O país que está nas suas mãos já era assim antes de si, mas quer que continue assim? A economia verde existe, e a verdade é que o bem estar da população traz riqueza ao país que pode não significar imediatamente em lucro para o país, mas a felicidade não é de ouro? Um país bem tratado, não é diamante?
Envio os meus sentimentos e toda a minha força para todos os que se encontram a debater o incêndio em Pedrogão Grande, sejam vitimas, operacionais, voluntários e familiares que agora têm viver e lidar com a perda de alguém.Mas a esperança é a ultima a morrer, e há sempre uma luz algures.
Sinceramente,